O instigante
poeta chileno Nicanor Parra completou 101
anos no último dia 5 de setembro. Em 2009, a Academia Brasileira de Letras e a Academia
Chilena de la Lengua, lançaram a antologia bilíngue Nicanor Parra e Vinícius de Moraes, com tradução e introdução de Carlos
Nejar e Maximino Fernández. As poesias de Nicanor
Parra foram extraídas do livro Poemas
para Combater a Calvície (Poemas para combatir la calvície,
1993).
Para
quem não conhece o escritor Nicanor
Parra, o irmão da magnífica Violeta Parra (1917-1967), um trecho do seu
perfil na apresentação de Nejar: “... rebelde,
contrário ao sistema que impõe suas regras, às vezes estranho, fantástico,
antissentimental, forjou seus antipoemas, ainda que “com odor delicado de
violetas”, para expressar seu descontentamento com o rumo da literatura
tradicional, operando com força desmistificadora. E escrever é nomear. E o
antipoema abriga a poesia ao avesso, poesia integralmente, sem rasuras,
caminhando contra a maré das leis canônicas de uma criação estética bem
comportada, em geral modulando a técnica do ritmo, sem o estuário das rimas (o
que não quer dizer que não as use, episodicamente) que singularizam a lira
tradicional. Ora lacônico e absurdo, ora concentradamente mordaz, ora
fraturando o sentido para alcançar outro maior, ora na enumeração que se
desvaira para configurar o revés das coisas, ora um surrealismo que se
fragmenta atiçado pela própria lucidez, ora com humor desavisado, ora quebrando
o protocolo e o pescoço da eloquência, através da paradoxal digressão e o
antilirismo. Kafkiano no espantoso; poundiano no uso de dialogismo; de Michaux,
fica-lhe o humor negro; de Vallejo certa erupção sintática; de Becket, o tom
satírico. É antipomposo, e, proverbialmente alegórico, teatral, nunca deixando
de ser ele mesmo, com sua máscara de um Chile ancestral, com rosto de efígie
asteca, imenso Poeta, parreira plantada na
linguagem. E não é em vão que um dos seus livros se chama Folha de Parra. (...)
Seu canto é civilizatório,
mas também conhece a barbárie. Poeta muitas vezes parabólico, sarcástico,
corrosivamente crítico de um mundo que não escolheu e nem o aceita, não busca
criar formas. As formas que o criam.”
Para homenagear
o poeta, selecionei cinco poemas da edição Nicanor
Parra e Vinícius de Moraes. Hoje: Dos
Chistes.
DOS CHISTES
Nicanor
Parra
YA NO PEDIMOS
PAN, TECHO NI ABRIGO
NOS CONFOMAMOS
COM UN POCO
DE
AIRE
EXCELENCIA
__________________________________
EL
ERROR CONSISTIÓ
EN
CREER QUE LA TIERRA ERA NUESTRA
CUANDO
LA VERDAD DE LAS COSAS
ES
QUE NOSOTROS SOMOS DE LA TIERRA
(De Chistes para
desorientar a la poesía)
.............................................................................
DOIS CHISTES
Nicanor Parra
tradução: Carlos
Nejar
JÁ
NÃO PEDIMOS
PÃO,
TETO NEM ABRIGO
NOS
CONFORMAMOS
COM
UM POUCO
DE
AR
EXCELÊNCIA
__________________________________
O ERRO CONSISTIU
EM CRER QUE A TERRA ERA NOSSA
QUANDO A VERDADE DAS COISAS
É QUE NÓS SOMOS DA TERRA
(De
Chistes para desorientar à poesia)
*
Ilustração de Joba Tridente.2015
Nicanor Parra
nasceu no Chile em 5 de setembro de 1914. Estreou com Cancioneiro
sem Nome (1937). Formou-se em Matemática e Física no Instituto Pedagógico
da Universidade do Chile. Estudou Mecânica avançada na Universidade de Brown,
Rhode Island, 1943-1945. Foi diretor interino da Escola de Engenharia da
Universidade do Chile. Discípulo do Cosmólogo E.A. Miner em Oxford e professor
de Mecânica Teórica na Universidade do Chile. A publicação da obra que o
consagrou deu-se em 1954, Poemas y Antipoemas.
Foi seguido de La cueca larga (1958)
e Versos de Salón (1962), Canciones
rusas (1967), Obra gruesa (1969),
Artefactos (1972), Sermones
y prédicas del Cristo de Elqui (1977), Nuevos
sermones y prédicas del Cristo de Elqui (1978), Chistes
para desorientar a la poesía (1983), Coplas
de Navidad (1983) y Hojas
de Parra (1985). Também publicou antologias em obras como Poesía
política (1983) e Poemas para combatir la calvicie
(1993). Fonte: Edição Nicanor Parra e Vinicius de Moraes.
Carlos Nejar: Poeta, Ficcionista e Crítico.
Pertence à Academia Brasileira de Letras e Academia Brasileira de Filosofia.
Traduziu Borges e Neruda, e possui livros publicados no Brasil e no Exterior.
Dos grandes poetas Nicanor y Vinicius. Gran noticia. ¿Por qué los dos juntos?
ResponderExcluir..., olá, sprezm, nas apresentações não há menção à reunião dos dois escritores na presente antologia. creio que seja porque, além da contemporaneidade, os dois têm uma poesia inquieta. muitos conhecem Vinícius mais como compositor e cantor, mas a sua poesia, em começo e carreira, é bem diferente.
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