domingo, 3 de agosto de 2014

Odes de Anacreonte - 1

Ainda na adolescência tive o meu interesse despertado para a Cultura Grega. Tentei, inclusive, aprender grego. Nunca me esqueço do prazer ao comprar (à prestação) o Paideia - A Formação do Homem Grego, de Werner Jaeger. 1345 páginas de deslumbramento. Odes de Anacreonte (Ediouro) é desta época. A princípio, pensei em postar umas três odes na tradução de Almeida Cousin. Depois, como tenho também a edição das mesmas odes traduzidas por Jamil Almansur Haddad e uma outra digital bilíngue, feita por Carlos A. Martins de Jesus, me pareceu interessante “contrapor” as três versões de Cupido de Cera. Na verdade, quatro, já que a de Cousin foi revista.
















UM CUPIDO DE CERA
Anacreonte

ρωτα κήρινόν τις
νεηνίης πώλει·
γ δέ ο παραστάς
’πόσου θέλεις’ φην ‘σοι
τ τυχθν κπρίωμαι;’
δ’ επε δωριάζων
’λάβ’ ατν ππόσου λις.
πως δ’ ν κμάθηις πν,
οκ εμ κηροτέχνας,
λλ’ ο θέλω συνοικεν
ρωτι παντορέκται.’
’δς ον, δς ατν μν
δραχμς, καλν σύνευνον.’
ρως, σ δ’ εθέως με
πύρωσον· ε δ μή, σύ
κατ φλογς τακήσηι.


Um Cupido de cera (1966)

Eros, moldado em cera,
Eis que um moço vendia.
Chego-me e lhe pergunto
O preço que teria:
- “Quanto será que queres
Por essa imagem? Diz?”
- “Paga-me o que quiseres
(disse em dórico rudo)
Em língua franca e rasa
Declaro: - Não o fiz
E até não quero em casa
Um Amor, que pede tudo
Que vê que eu tenho – o estrago!”
- “Pois dá-mo, que to pago
Até por um dracma.
Há de ficar comigo
Esse amorinho lindo...
Tu, Eros, ouve logo:
Abrasa-me! – ou prometo,
Se não me dás tal fogo,
Nas chamas te derreto...”


Um Cupido de cera (1983)

Eros, moldado em cera,
Eis que um moço vendia.
Chego-me e lhe pergunto
O preço que teria:
- Quanto será que queres
Por essa imagem. Diz.
- Paga-me o que quiseres
(disse em dórico rudo)
- Não fui eu quem o fiz
E até não quero em casa
Um Amor, que pede tudo
Sem me tornar feliz.
- Pois dá-mo, que to pago
Até por um dracma.
Há de ficar comigo
Esse andorinho lindo...
Tu, Eros, ouve logo:
Abrasa-me! – ou prometo,
Se não me dás tal fogo,
Sou eu que te derreto...”

A tradução de Almeida Cousin encontra-se na segunda edição bilíngue Odes de Anacreonte, Edições de Ouro (1966), e na Edição Achiamé, de 1983.


Sobre um Cupido de cera

Comprei por uma dracma um Cupido de Cera,
obra-prima de artífice.
Pu-lo sobre o leito.
Supus que ele fosse queimar o meu peito.
Mas na noite plena de sussurros e mistérios,
a noiva coroou-se de salsa
e a chama, sendo alta,
quem se dissolveu foi Eros.

Tradução de Jamil Almansur Haddad publicada em Odes Anacreônticas, Editora José Olympio (1952).


(sem título)

Um Eros de cera certo
moço estava a vender.
Eu, parando a seu lado,
lhe perguntei: “quanto queres
pela tua obra de arte?”
Responde-me ele em dórico:
“Leva-o por quanto quiseres!
E para tudo ficares a saber,
não sou escultor de cera,
apenas não quero conviver
com um Eros tão atrevido.”
“Dá-mo, dá-mo por uma dracma,
esse belo companheiro de leito.”
E tu Eros, sem demora,
abrasa-me; senão, tu mesmo
hás-de derreter nas chamas.

Tradução de Carlos A. Martins de Jesus publicada em Anacreontea - Poemas à maneira de Anacreote - Edição digital Fluir Perene (2009).

*
arte de Joba Tridente (2014) sobre a escultura Eros de Lysippos (séc. IV a.C.)


José Coelho de Almeida Cousin (1897 - 1991), farmacêutico, advogado escritor, cronista, crítico, jornalista. Na década de 30 foi redator da revista Vida Capichaba e colaborador de diversos periódicos do Espírito Santo. Foi Membro da Academia Espírito-Santense de Letras. É autor, entre outras obras, de: Chispas (1924); Itamonte (1932); Naufrágios (1937); O amor de Dom Juan; Poemas da terra e da vida; Epopeia brasilista; A sagração da mulher; Cem anos de memórias; Mundos e Fundos; Cartas Antigas; Troveirinho, Tradução: Odes de Anacreonte (Pongetti, 1948; Edições de Ouro, 1966; Edição Achiamé, 1983). Fontes web: Enciclopédia de Literatura Brasileira.

Jamil Almansur Haddad (1914 - 1988), médico, crítico, ensaísta, escritor, historiados, teatrólogo, antologista, tradutor. Haddad foi presidente do Clube de Poesia de São Paulo, membro da Academia Paulista de Letras, e colaborador de diversos jornais paulistas. De origem libanesa, converteu-se ao Islamismo. Os livros Alkamar, a Minha Amante e Orações Negras foram premiados pela Academia Brasileira de Letras. Entre suas obras destacam-se: Contos árabes; As obras-primas da poesia religiosa brasileira; Histórias galantes; História poética do Brasil; Raízes de Castro Alves. Traduziu: Cântico dos cânticos; Omar Khayyam: Rubaiyat; Petrarca: Cancioneiro; Boccaccio: Decamerão; Odes Anacreônticas (1952); Victor Hugo: Odes e Baladas; Ovídio: A arte de amar; Giosue Carducci: Poesias escolhidas. Fonte web: Wikipédia.

Carlos A. Martins de Jesus é Doutor em Letras pela Universidade de Coimbra, na especialidade de Literatura Grega (2012), Mestre (2007) e Licenciado (2005) pela mesma instituição, desenvolvendo à data um projeto de Pós-doutoramento em torno da Antologia Grega. Tem trabalhado sobretudo com poesia grega (arcaica, clássica e tardo-clássica) e iconografia, em especial a cerâmica grega. Com várias dezenas de trabalhos publicados, entre monografias, comunicações e artigos em revistas nacionais e internacionais da especialidade, assinou a tradução portuguesa de obras como os Fragmentos Poéticos, de Arquíloco (2008), o Diálogo sobre o Amor, de Plutarco (2009), os Anacreontea (2010), Suplicantes, de Ésquilo (2012) e As Vespas, de Aristófanes (2010). Tem ainda trabalhado como dramaturgo, encenador, produtor e ator no âmbito do teatro de tema clássico, em Portugal e Espanha. Fonte web: Plataforma DeGóis.

2 comentários:

  1. Estou procurando aquelas odes dele em que fala de vinho.

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  2. ..., olá, Fernando, assim como edição "Odes de Anacreonte" (EDIOURO), a Anacreontea - Poemas à maneira de Anacreonte (Fluir Perene) traz vários poemas falando de vinho e bebedeiras. ..., sabe exatamente qual ou quais seriam? ..., este dois, por exemplo, estão em Anacreontea, com tradução de Carlos A. Martins de Jesus:

    Quando bebo o meu vinho,
    o meu coração se acalenta,
    [uma canção] se põe a entoar
    [e a espicaçar] as Musas.
    Quando bebo o meu vinho,
    debandam as preocupações,
    os muitos cuidados e vontades
    para os ventos que sacodem o mar.
    Quando bebo o meu vinho,
    então Baco, que dissipa as penas,
    com brisas de muitas flores
    me excita, alegrando-me com a bebedeira.
    Quando bebo o meu vinho,
    com grinladas de flores entrelaçadas
    e ajustadas à minha fronte,
    canto a serenidade da vida.
    Quando bebo o meu vinho,
    com mirra odorífera ungida
    a pele, e nos braços uma moça
    apertando, Cípris celebro a cantar.
    Quando bebo o meu vinho,
    sob o efeito das côncavas taças
    o meu espírito libertando,
    rejubilo com o tíaso1 de rapazes.
    Quando bebo o meu vinho,
    esta certeza apenas me aproveita,
    esta certeza levarei para toda a parte:
    a de morrer, como todas as coisas.
    1 Originalmente, o thiasos era o grupo, de carácter selvático, que prestava
    culto a Diónisos. Neste contexto, está associado ao vinho e ao cenário de banquete.



    O cacho de uvas de negra tez
    em cestos o levam os homens
    e as moças aos ombros
    [.......................................]
    quando para o lagar o atiram,
    apenas os varões o pisam,
    dos cachos libertando o vinho,
    bem alto aplaudindo o deus
    com cantos de vindima,
    ao ver espumar, nas vasilhas,
    o amável Baco novo.
    Sempre que o bebe um velho,
    de pés trémulos é vê-lo dançar,
    a branca cabeleira agitando.
    A uma moça armou a rede
    um amável mancebo […
    …] e, agachando-se,
    o seu corpo gentil, estendido
    sobre folhas ensombradas, ele abraça,
    vencida que esteja pelo sono.
    E Eros, com inoportunos feitiços,
    [incentiva a rapariga às futuras]
    bodas se tornar infiel.
    Ele, não a convencendo por palavras,
    mesmo sem ela querer a aperta:
    deste modo Baco, entre a gente nova,
    ébrio se diverte e espalha a confusão.


    ..., espero ter ajudado. ..., grato pela visita. abs! T+

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