sexta-feira, 5 de julho de 2013

Friedrich Schiller: A Luva - 3



Pensei em postar ao menos uma “versão abominável” de A Luva, de Friedrich Schiller (1759-1805), mas optei mesmo pela qualidade e curiosidade, no caso de Castellamare. Esta terceira tradução é do grande poeta português Mário de Sá-Carneiro, encontra-se no livro Poesia - Mário de Sá-Carneiro (organização Fernando Paixão), da Iluminuras, 2001.


                          

A Luva
Friedrich Schiller 
Tradução de Mario de Sá-Carneiro
        
Ia-se travar um mui sangrento
Combate entre medonhas feras,
(Oh! bárbaros costumes d’outras eras
Em que existia tal divertimento)
E como já era el-rei sentado
Altivo, soberbo, majestoso,
Pelos fidalgos rodeado
E formando um círculo gracioso
Eram as damas num balcão
Alegres... sorridentes... lindas... belas...
Abrem-se as jaulas e sai delas
Primeiramente aos saltos um leão.
Depois em carreira mais veloz
Do Rei das Selvas ao encontro vem
Um tigre rugindo, mui feroz
Que de Satanás os olhos tem.
Tudo se torna então silencioso
Olhando as feras mudo... ansioso!
Mas não se lançam!... Deitam-se no chão
Uma ao pé da outra!...

                                Do balcão
Precisamente ao meio entre elas
Uma luva cai da linda mão
Da mais linda de todas as donzelas.

E ao seu cavaleiro diz assim
A dona da luva:
                                “ – Se o amor
Que asseguras nutrir por mim
É tão ardente quanto me jurais,
Se diante do perigo vós não existais
A luva ide apanhar-me já, senhor!”

Rápido como um raio e sem pestanejar
Ao terrível recinto desce o cavaleiro!...
Com terror... com espanto verdadeiro
Veem-no todos avançar!...

...........................................................................
...........................................................................

Ele traz a luva são e salvo!
Ressoa então um grito de louvor!...
Desse grito é ele só o alvo!...

Com um muito terno olhar d’amor
Recebe a donzela o vencedor;
Mas embora nesse olhar ofereça
Ao cavaleiro a felicidade querida
Ele ao rosto a luva lhe arremessa
Voltando-lhe as costas em seguida!

*
Ilustração de Joba Tridente



Friedrich Schiller 

Vor seinem Löwengarten,
Das Kampfspiel zu erwarten,
Saß König Franz,
Und um ihn die Großen der Krone,
Und rings auf hohem Balkone
Die Damen in schönem Kranz.

Und wie er winkt mit dem Finger,
Auf tut sich der weite Zwinger,
Und hinein mit bedächtigem Schritt
Ein Löwe tritt,
Und sieht sich stumm
Rings um,
Mit langem Gähnen,
Und schüttelt die Mähnen,
Und streckt die Glieder,
Und legt sich nieder.

Und der König winkt wieder,
Da öffnet sich behend
Ein zweites Tor,
Daraus rennt
Mit wildem Sprunge
Ein Tiger hervor,

Wie der den Löwen erschaut,
Brüllt er laut,
Schlägt mit dem Schweif
Einen furchtbaren Reif,
Und recket die Zunge,
Und im Kreise scheu
Umgeht er den Leu
Grimmig schnurrend;
Drauf streckt er sich murrend
Zur Seite nieder.

Und der König winkt wieder,
Da speit das doppelt geöffnete Haus
Zwei Leoparden auf einmal aus,
Die stürzen mit mutiger Kampfbegier
Auf das Tigertier,
Das packt sie mit seinen grimmigen Tatzen,
Und der Leu mit Gebrüll
Richtet sich auf, da wird's still,
Und herum im Kreis,
Von Mordsucht heiß,
Lagern die greulichen Katzen.
Da fällt von des Altans Rand
Ein Handschuh von schöner Hand
Zwischen den Tiger und den Leun
Mitten hinein.

Und zu Ritter Delorges spottenderweis
Wendet sich Fräulein Kunigund:
»Herr Ritter, ist Eure Lieb so heiß,
Wie Ihr mir's schwört zu jeder Stund,
Ei, so hebt mir den Handschuh auf.«

Und der Ritter in schnellem Lauf
Steigt hinab in den furchtbarn Zwinger
Mit festem Schritte,
Und aus der Ungeheuer Mitte
Nimmt er den Handschuh mit keckem Finger.

Und mit Erstaunen und mit Grauen
Sehen's die Ritter und Edelfrauen,
Und gelassen bringt er den Handschuh zurück.
Da schallt ihm sein Lob aus jedem Munde,
Aber mit zärtlichem Liebesblick –
Er verheißt ihm sein nahes Glück –
Empfängt ihn Fräulein Kunigunde.
Und er wirft ihr den Handschuh ins Gesicht:
»Den Dank, Dame, begehr ich nicht«,
Und verläßt sie zur selben Stunde.


Johann Christoph Friedrich von Schiller (1759 - 1805), poeta, dramaturgo, filósofo, historiador, é um dos maiores escritores alemães.  Autor de Ode à Alegria (1875), que inspirou a 9ª Sinfonia, de Beethowen (1770 - 1827), Schiller partilhou com Goethe, além de longa amizade, a literatura. As Xénias (1797) foi composta pelos dois. Na web há farto material biográfico sobre o autor de Os Bandoleiros (1781), Don Carlos (1787/88), Maria Stuart (1800), Turandot (1801), Guilherme Tell (1803/04), Cartas Filosóficas (1786). O popular A Luva é de 1797.

Mário de Sá-Carneiro (Lisboa, 1890 - Paris, 1916), escritor modernista de prosa e verso. Dividiu com Fernando Pessoa a edição da polêmica revista literária Orpheu e merecidamente também divide as glórias da literatura portuguesa. Boêmio, social e psicologicamente instável, Sá-Carneiro suicidou-se aos 25 anos, deixando uma produção literária irretocável: Amizade (1912); Princípio (1912); Memórias de Paris (1913); A Confissão de Lúcio (1914); Dispersão (1914); Céu em Fogo (1915).

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