quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Olavo Bilac - Poesias Infantis


Nos últimos 100 anos muita coisa mudou na Literatura Infantil..., inclusive o conceito de Literatura Infantil. Veja o que pensava o grande escritor Olavo Bilac quando, a pedido Editora Francisco Alves, escreveu, em 1895, o seu famoso livro Poesias Infantis, publicado em 1904 e 1929:

Ao Leitor
Quando a casa Alves & Cª me incumbiu de preparar este livro para uso das aulas de instrução primária, não deixei de pensar, com receios, nas dificuldades grandes do trabalho. Era preciso fazer qualquer coisa simples, acessível à inteligência das crianças; e quem vive a escrever, vencendo dificuldades de forma, fica viciado pelo hábito de fazer estilo. Como perder o escritor a feição que já adquiriu, e as suas complicadas construções de frase, e o seu arsenal de vocábulos peregrinos, para se colocar ao alcance da inteligência infantil?

Outro perigo: a possibilidade de cair no extremo oposto – fazendo um livro ingênuo demais, ou, o que seria pior, um livro, como tantos há por aí, falso, cheio de histórias maravilhosas e tolas que desenvolvem a credulidade das crianças, fazendo-as ter medo de coisas que não existem. Era preciso achar assuntos simples, humanos, naturais, que, fugindo da banalidade, não fossem também fatigar o cérebro do pequenino leitor, exigindo dele uma reflexão demorada e profunda.

Mas a dificuldade maior era realmente a da forma. Em certos livros de leitura que todos conhecemos, os autores, querendo evitar o apuro do estilo, fazem períodos sem sintaxe e versos sem metrificação, uma poesia infantil conheço eu, longa, que não tem um só verso certo! Não é irrisório que, querendo educar o ouvido da criança, e dar-lhe o amor da harmonia e da cadência, se lhe deem justamente versos errados, que apenas são versos por que rimam, e rimam quase sempre erradamente?

Não sei se consegui vencer todas essas dificuldades. O livro aqui está. É um livro em que não há animais que falam, nem fadas que protegem ou perseguem crianças, nem as feiticeiras que entram pelos buracos das fechaduras; há aqui descrições da natureza, cenas de família, hinos ao trabalho, à fé, ao dever; alusões ligeiras à história da pátria, pequenos contos em que a bondade é louvada e premiada.

Quanto ao estilo do livro, que os competentes o julguem. Fiz o possível para não escrever de maneira que parecesse fútil demais aos artistas e complicada demais ás crianças.

Se a tentativa falhar, restar-me-há o consolo de ter feito um esforço digno. Quis das à literatura escolar do Brasil um livro que lhe faltava.
O.B.

A Pátria
Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!
Criança! não verás nenhum país como este!
Olha que céu! que mar! que rios! que floresta!
A Natureza, aqui, perpetuamente em festa,
É um seio de mãe a transbordar carinhos.
Vê que vida há no chão! vê que vida há nos ninhos,
Que se balançam no ar, entre os ramos inquietos!
Vê que luz, que calor, que multidão de insetos!
Vê que grande extensão de matas, onde impera
Fecunda e luminosa, a eterna primavera!
Boa terra! jamais negou a quem trabalha
O pão que mata a fome, o teto que agasalha...

Quem com seu suor a fecunda e umedece,
vê pago o seu esforço, e é feliz, e enriquece!

Criança! não verás país nenhum como este:
Imita na grandeza a terra em que nasceste!


Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac (16.12.1865 – 28.12.1918), jornalista, escritor e membro fundador da Academia Brasileira de Letras (1896), onde ocupou a cadeira 15, cujo patrono é o poeta Gonçalves Dias. É autor de Poesias Infantis (1904 ou 1929); Teatro Infantil (?); Contos Pátrios (1904); Antologia Poética (?); Crônicas e Novelas (1894); Tarde (1919); Crítica e Fantasia (1906); Tratado de Versificação (1910); Dicionário de Rimas (1913); Ironia e Piedade (1916); Conferências Literárias (1906).

Arte de Joba Tridente sobre foto de: (?)


4 comentários:

  1. Que sensivel!... é muito difícil escrever pra crianças... tem q se transformar o rebuscado em simples... talento para poucos :)

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    1. Olá, Ariete.
      Ser (e não parecer) simples na lida diária com o verbo
      é um exercício para muitos,
      mas um domínio para poucos.

      Abs

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  2. Hj vi uns vídeos de escolas q mostravam toda uma mobilização de crianças e professores “valorizando o ser humano”... chorei... chorei de saudades de lembrar uma coisa singela q fiz em uma escola q trabalhei, qdo os EUA invadiram o Iraque... uma manifestação pela paz... nossa, foi bem trabalhoso, mas o resultado foi tão bacana... senti tanta falta das crianças... eu curtia muito ser profe... hj eu escrevo pros pequenos... faço isso com tanto prazer... foi simbolico a mim essa postagem sua :) grande abraço

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    Respostas
    1. Olá, Ariete,
      só hoje vi seu novo comentário.
      Dia desses, trabalhando num projeto literário,
      me lembrei de um livro de leitura e interpretação de texto,
      com obras curtas (prosa e verso) de diversos autores,
      do meu tempo de primário e que, infelizmente, não é mais usado,
      parece-me que por conta de Direitos Autorais,
      que me escancarou portas e janelas para as delícias da literatura.
      Ali também estava Bilac,com os seus poéticos contos.

      Que bom saber da sua (pré)ocupação humanitária
      e que é também escreve para os pequenos.
      Fale mais da sua obra!
      Tem site ou blog?

      Vamos nos falando.
      Grande abraço.

      T+

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